A História da Alimentação no Brasil

A História da

Alimentação no Brasil

Neste imenso país que é o Brasil, temos uma rica culinária regionalizada, quase impossível de ser generalizada em um território marcado por diferenças tão grandes. Um gaúcho acostumado ao seu churrasco provavelmente jamais ouviu falar no pato no tucupi da Amazônia.

A comida de uma região soa exótica para outra região dentro do mesmo País. Muitas vezes, as frutas nativas são desconhecidas dos próprios brasileiros. Um bebê urbano pode tomar suco de kiwi todos os dias e passar a vida sem provar um mingau de tapioca com açaí, sem ver um araçá, um cumbucá, um sapoti, um jenipapo. Fonte: http://www.mre.gov.br

A culinária brasileira é resultante de uma mistura de tradições, ingredientes e alimentos que foram introduzidos não somente pela população indígena nativa, mas por todas as correntes de imigração que ocorreram ao longo da história deste país. O descobrimento do Brasil ocorreu em função da gastronomia, já que os portugueses estavam à procura de uma nova rota para Índias em busca de especiarias.

A gastronomia do Brasil nasceu da mistura de hábitos dos índios nativos, dos colonizadores portugueses e dos negros africanos que foram trazidos para trabalhar nas lavouras. E mais tarde, pelos imigrantes diversos que chegaram ao país, tais como: italianos, alemães, japoneses, poloneses, libaneses, entre outros. Devido à grande diversidade de vegetação, clima, relevo, tipo de solo e de povos que habitam cada região brasileira, é muito difícil identificar um prato tipicamente nacional. O Brasil tem uma enorme diversidade e uma riqueza gastronômica imensurável.

Feijoada, um dos milhares de pratos típicos brasileiros. Imagem de Gilmar Koizumi por Pixabay.

Nativos

Muitas das técnicas de preparo e ingredientes são de origem indígena, tendo sofrido adaptações por parte dos escravos e dos portugueses. Os índios nativos contribuíram com mandioca, também chamada de aipim, castelinha, mandioca-doce, maniva, maniveira, macaxeira, candinga, macamba, tapioca, uaipi, xagala, mandioca-mansa, pau-farinha, pão-da-américa, pão-de-pobre, xagala, entre outros e seus vários usos. Além da mandioca, os índios também se alimentavam de milho, cará, batata-doce e diversos tipos de pimentas. Era comum o consumo de peixes e caça – tatus, codornas, perdizes, jacarés, gambás, macacos, tatus e antas. As frutas mais consumidas eram maracujá, pitanga, jabuticaba, jenipapo, açaí, cupuaçu, murici, cajá, pitomba, mangaba e caju. Como processo de preparo herdado dos indígenas temos o moquém, que consiste em secar a carne no fogo para ser consumida mais tarde.

Portugueses

Os portugueses contribuíram com o gosto pelo açúcar e o consumo da carne de porco e de sal, além da farinha de trigo. Eles foram os primeiros responsáveis por trocas alimentares e formação de novos hábitos. Eles traziam e levavam mercadorias de todos os lugares através das navegações. Vários produtos se enraizaram tanto no país que muitos pensam que são “nativos” do Brasil, tais como: Manga, jaca, quiabo, banana, coco, café e cana-de-açúcar. Os portugueses contribuíram também com técnicas de preparo dos alimentos, como por exemplo, as frituras.

Africanos

A influência africana na alimentação do brasileiro tem dois aspectos importantes. O primeiro é o modo de preparar e temperar os alimentos. A cozinha africana privilegia os assados em detrimento das frituras. O caldo é um item importante da culinária africana e provém do alimento assado ou preparado com água e sal. É utilizado na mistura com farinha obtida de diversos elementos. O modo africano de cozinhar e temperar incorporou elementos culinários a pratos típicos portugueses e indígenas. O segundo aspecto é a introdução de ingredientes na culinária brasileira. Todas as receitas no Brasil feitas de milho nasceram na senzala, porque o milho, naquele período, era comido apenas por animais e escravos. Os portugueses não davam a mínima importância ao milho, pois faziam relação com o sorgo. Os escravos juntaram ao milho os ingredientes que podiam usar, tais como o açúcar pouco refinado, o açúcar mascavo e a rapadura e criaram o angu, o munguzá e a pamonha. A rapadura, a cachaça, a garapa e o pé-de-moleque difundiram-se no período colonial como artifícios culinários de escravos e brancos pobres para “matar” a fome

Imigrantes

Já entre os séculos XIX e XX, vieram os imigrantes e estes trouxeram algumas novidades ao cardápio brasileiro fortalecendo o consumo de diversos ingredientes. O objetivo principal da chegada dos imigrantes na região Sudeste do Brasil era trabalhar na lavoura do café, já a imigração para a Região Sul do país tinha o objetivo de ocupar áreas pouco povoadas. Segue um resumo histórico da chegada dos imigrantes.

1744 – As primeiras famílias de imigrantes que aportaram no Sul eram constituídas de portugueses das Ilhas de Açores e da Madeira, que vieram para o Brasil por determinação da Coroa Portuguesa. O barreado ou carne barreada é um prato típico do litoral paranaense, sendo o mais tradicional do estado. A receita respeita um ritual de trezentos anos, e segundo alguns historiadores, teria sido trazida pelos imigrantes açorianos no século XVIII. O nome vem da expressão “barrear” a panela, com um pirão de farinha de mandioca, para evitar que o vapor escape e o cozido seque depressa.

1824 – As primeiras famílias não portuguesas foram de imigrantes alemães que chegaram ao Sul do país e construíram a cidade de São Leopoldo.

1850 – Os alemães chegaram em Santa Catarina, com Herman Blumenau, que fundou a cidade que leva seu sobrenome. Os alemães trouxeram seus costumes e receitas como carnes defumadas, salsichão, chucrute, pão preto, bolo floresta negra. Foram eles também que trouxeram os processos de fermentação e produção da cerveja, adaptada ao paladar brasileiro e servida de uma forma mais tropical, estupidamente gelada, diferente do padrão europeu.

1875 – Nas terras de Garibaldi, Caxias do Sul e Bento Gonçalves, os imigrantes começaram a plantar uvas e produzir vinhos. Em toda zona rural da região Sul do Brasil, é possível degustar os pratos que incluem as preparações citadas, além do vinho, da grappa (aguardente de uva) e do café colonial preparado pelas famílias descendentes de alemães e italianos. Muitos italianos foram para São Paulo, onde se fixaram em busca de oportunidades e abriram as cantinas. No início do século XX, as cantinas viraram pequenos restaurantes, decorados com os objetos pendurados como nos armazéns, onde produziam e comercializavam massas, pão, pizzas, polenta de milho e molhos característicos da cozinha italiana.

As Influências nas Diversas Regiões do Brasil

A gastronomia da Região Centro-Oeste é altamente influenciada pela pecuária, uma das principais atividades econômicas da região, daí a grande preferência da população por carne bovina, caprina e suína. O ciclo da imigração também trouxe influências africanas, portuguesas, sírias e italianas à culinária local. Além disso, a forte presença indígena liderou a preferência regional por raízes. Mato Grosso sofreu influência da culinária latino-americana, sobretudo nos ensopados de peixe. Devido à diversidade da fauna pantaneira, carnes exóticas e peixes típicos da região, como pacu, pintado e dourado, também fazem parte do cardápio local. Dois pratos representativos da culinária do Centro-Oeste, especialmente de Goiás, são o arroz com pequi e o empadão goiano, que pode ser recheado com linguiça, carne de porco, de frango, queijo e guariroba (uma espécie de palito amargo). Doces de frutas em compotas também são bastante comuns. Os pratos com peixes amazônicos são de hábito indígena, comuns em Mato Grosso, assim como no Mato Grosso do Sul. Neste último, percebe-se também a contribuição dos migrantes do Sul do país, que levaram o churrasco (com mandioca), o arroz de carreteiro (tropeiros) e o tereré, uma variação gelada do chimarrão bebido quente nos pampas gaúchos.

Furrundu

Um doce típico do pantanal mato-grossense que espelha a mistura de povos e culturas no Brasil.

Até o século XIX, a cozinha da Região Sudeste era influenciada por portugueses, indígenas e africanos. Os portugueses, em especial, influenciaram bastante a comida dos estados do Sudeste. Veio dos “patrícios” o apreço pela carne de porco e os doces em Minas Gerais. No Rio de Janeiro, o bacalhau e a feijoada são heranças dos antepassados lusitanos. Pratos com peixes e frutos do mar, como a moqueca capixaba, são o carro-chefe da culinária do Espírito Santo, que carrega vários traços da alimentação indígena. A culinária capixaba é um pouco diferenciada, pois, em função da sua proximidade com a Região Nordeste, e sua grande área litorânea, há grande presença de peixes e frutos do mar. Após a chegada dos imigrantes japoneses, libaneses, sírios, italianos e espanhóis, a diversidade gastronômica aumentou, sobretudo em São Paulo, onde faz sucesso o cuscuz.

Angu à Mineira

Que tal apreciar um delicioso prato de Minas Gerais. O angu é muito fácil de fazer e pode servir de acompanhamento para diversos pratos.

A culinária nordestina são três: a sertaneja, a litorânea e a maranhense. A cozinha sertaneja é rústica e de resistência de acordo com a condição hostil climática da região. Uso de ingredientes de pouco cuidado, tais como: mandioca e suas farinhas, milho, feijão verde, feijão mulatinho e o feijão andu. As carnes são o carneiro, cabrito e bode, e deles tudo se aproveita, até os miúdos e o bucho. Para aumentar a durabilidade se faz a carne seca (jabá e carne de sol). Para adoçar, tem o melado e a rapadura.

A culinária do litoral nordestino permanece a farinha de mandioca e entra uma grande variedade de pratos com peixe (fresco, salgado ou seco), camarões e frutos do mar. Receitas acrescidas com leite de coco. Além disso, a fartura de rapadura, açúcar mascavo e melado faz a região ser rica em doces e bolos. Ainda temos a cozinha afro-brasileira, a cozinha de santo, de dendê, criada no Recôncavo Baiano, produto do sincretismo de culturas.

E finalizando o trio gastronômico nordestino, temos a culinária maranhense marcada pela influência portuguesa, indígena e francesa. Culinária de sobrevivência que resultou na consagração do arroz, que já crescia na forma silvestre na região e de ingredientes exóticos, como a azedinha. Arroz e farinha de mandioca são ingredientes básicos.

Bobó de Camarão

Prato típico da culinária do litoral nordestino. É um dos pratos mais pedidos na Bahia e bem popular em outros lugares do Brasil.

A região Norte é formada em grande parte pela Floresta Amazônica e de forma diferente do que aconteceu em outras regiões, nas quais diversas influências culinárias se mesclaram, no Norte prevaleceu a forma de cozinhar dos índios. Alguns chegam a considerar que a culinária do Norte é a genuína brasileira, pois é a que se formou com os recursos naturais, influenciada pelo povo que vivia no país antes mesmo da colonização. A cozinha original dos índios é simples. Alimentos assados, moqueados, tostados e, às vezes, cozidos. Eles não conhecem o açúcar e usam raramente o sal. A culinária nortista, em geral, é composta de peixes, mandioca, milho, ervas naturais, tapioca, farinha d’água e frutas silvestres. É com esses ingredientes que se fazem, por exemplo, o pato no tucupi e caldeirada de tucunaré que encantam os visitantes.

Moqueca de Banana da Terra

Na Amazônia é servido como acompanhamento do Camarão Marajoara.

A mistura étnica ocorrida na Região Sul resultou numa culinária completamente diferente da do resto do país, com a presença ainda mais marcante da cozinha Italiana e da alemã, além das já presentes portuguesa e espanhola. As “marcas registradas” são o churrasco gaúcho, pratos de influência alemã, em Santa Catarina (marreco recheado, strudel de maçã), e o barreado paranaense, preparado em panela de barro e de forte influência portuguesa.

Sagu

É uma sobremesa deliciosa e um prato típico do Rio Grande do Sul.

Pelo que vimos anteriormente. o Brasil possui uma infinidade de cozinhas. Qual é a melhor delas? Segundo Oscar Wilde, “A melhor cozinha, e a mais simples, é sempre a favorita daqueles com espírito aberto e cultivado.” Cada cultura gera uma gastronomia peculiar, com receitas, ingredientes, aromas, técnicas de preparação, maneiras de servir e até de comer. Também têm classificações particulares e regras precisas, tanto em relação à preparação como à combinação dos alimentos, relativa à colheita, à produção, à conservação e ao consumo. Uma cozinha típica vai além de uma lista de pratos “pitorescos”: ela é o reconhecimento de pratos como representativos de pertencimento a um grupo, a uma sociedade. Ou seja, é o modo pelo qual as pessoas querem ser vistas e reconhecidas. As cozinhas típicas são importantes elementos da IDENTIDADE CULTURAL, relacionada à cultura regional pelos costumes e comportamentos de um povo.

O Brasil é um país continental, de cultura mais diversificada e abrangente do planeta. Como vimos, o nosso povo é fruto de uma enorme miscigenação de culturas, o que fez com que ele se tornasse berço de movimentos culturais e criações culinárias em abundância. Conhecer a gastronomia brasileira é ir além de seus pratos, pois envolve o conhecimento das raízes do Brasil. Cada região tem suas próprias características, que resultam na mistura de tradição, ingredientes e alimentos locais. E não faltam opções, que permeiam por diferentes culinárias regionais e que abrangem os mais variados pratos, do mais simples e rústico à alta e sofisticada gastronomia.

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Eu sou graduada e pós graduada na área de gastronomia e compilei todos os anos de estudo em apostilas que estou transformando em um livro “Diário da Gastronomia. De Tudo… Um Pouco.” (Para saber mais acesse a página A Gastrônoma, A Autora, A Terapeuta, A Multiface). Através deste site postarei informações importantes que contribuirá para aumentar o conhecimento dos leitores na área de gastronomia A parte teórica pode ser encontrada na páginaConceitos e Teorias“. Quanto à prática, os leitores podem ir treinando com asReceitaspostadas. Todas as receitas foram previamente testadas.


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CAPA: Imagem de giovanni sacchi por Pixabay


REFERÊNCIAS:

CULINÁRIA BRASILEIRA. Artigo publicado no site Portal São Francisco. Disponível em http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/mulher-culinaria-brasileira/culinaria-brasileira.php Acesso em 28/02/2016, às 12h.

RADAELLI, Patrícia; RECINE, Elisabetta. Revisão: FERREIRA, Taísa. Alimentação e cultura. Apostila do Departamento de Nutrição da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (FS/UnB) e da Área Técnica de Alimentação e Nutrição do Departamento de Atenção Básica da Secretaria de Política de Saúde do Ministério da Saúde (DAB/SPS/MS). 66 páginas. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/alimentacao_cultura.pdf Acesso em: 21/09/2016, às 21h.

SENAC, DN. A história da gastronomia / Maria Leonor de Macedo Soares Leal. Rio de Janeiro. Ed. Senac Nacional, 1998. 144p. il.

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